sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

O embrião da competitividade

          Aniversário de criança. Um dia muito especial para os pequenos, entretidos pela brincadeira, e, por mais estranho que soe, para os adultos também. Para os adultos? Sim, a comida e bebida lhes interessa absurdamente. Entretanto, além disso, como ser humano e escritora amadora, uma atitude básica e simples que efetuei inconscientemente em determinada festa foi a arte da observação.  
       Era aniversário de meu primo de seus poucos seis anos. A festa correu bem e nada de ruim aconteceu. Porém, um fato imperceptível aos olhos alheios incomodou-me após o parabéns. Estourar o esperado “balão”. Aquela enorme bexiga colorida pendurada no teto, densa, dotada de inúmeros doces para a alegria dos pequeninos. Rapidamente, uma aglomeração surgiu ao entorno da atração. Todos buscavam se posicionar em uma posição privilegiada, para  que quando as balas e doces caíssem as crianças pudessem agarrar desesperadamente ao máximo de alimentos que conseguissem. Boom! Balas, chicletes, pirulitos e chocolates vieram abaixo. Inicialmente, diversas mãos  ergueram-se para cima, umas por cima das outras — vantagem considerável para as crianças com alguns centímetros maior que a altura da média. Em segundos, após o término da queda e as embalagens coloridas ficarem esticadas e expostas ao chão, todos atacaram buscando arrecadar sua parcela da recompensa.
       Pronto! Aqui está exposto, em uma simples atitude, o sistema vigente que nos comanda, o capitalismo, a sociedade meritocrática. Cada criança receberia ali a quantidade adequada ao seu teórico esforço para sair com as mãos unidas, preenchidas de balas e sorrisos nos rostos. Contudo, muitos que se esforçaram igualmente, não conseguiram a mesma recompensa, devido a inúmeros fatores, sejam eles a altura que permitiu dificuldade perante aos outros, a idade e sua posição( mais próximo ou afastado do balão). Naquele local, tais crianças, mesmo  sem saberem a proporção de suas atitudes, aparentemente singelas, estavam concretizando o conceito, encaminhando o desenvolvimento do embrião da sociedade competitiva a que somos subjugados culturalmente e socialmente.
       Porém, nem tudo estava perdido naquela cena, qual poderia ser considerada uma destruição a consciência de união das crianças. Ao fim da disputa, algumas crianças, poucas, entregavam aos pais as balas que nem  cabiam  mais na palma da mão, transbordavam. Em contrapartida, outras viam-se amuadas em um canto, com no máximo três balas entre os dedos. Meio a esse cenário, uma participação importante entrou em ação. Um dos pais, vendo o filho com balas demais para serem consumidas somente por ele, disse ao menino que doasse, compartilhasse um pouco de suas guloseimas com uma menininha decepcionada por ter pego pouco daquela bexiga. E assim foi feito.
   Ao assistir a cena do repartir com o outro, um alivio breve permeou minha consciência.
   Não interprete, assim, caro leitor, de maneira errônea esse pequeno texto, pois não há nenhum apoio a governos socialistas ou comunistas em sua conclusão. Existe, com toda certeza, a vontade de mostrar o quanto nossa forma de organização é injusta e como isso se insere em pequenas ações cotidianas. Ademais, a atitude do pai, junto ao filho, demonstra a resistência de minorias a favor de algo mais justo, igualitário, de acesso a todos. Deve-se, portanto, notar aquilo que está implícito em cada ação para transformá-la, impedindo a perpetuação de embriões como esse.  



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