sábado, 17 de setembro de 2016

O primeiro e último botão

Todos os dias a mulher regava a última aquisição de seu jardim com um ar intimidador. Durante o percurso de regar as demais plantas o sorriso estampava-se no rosto de Ana, encantada com os coloridos cheiros que enfeitavam seu quintal. Contudo, ao deparar-se com sua mais nova aquisição, uma pequena planta, de galhos finos e aparentemente fracos, seu rosto fechava-se em terrível decepção. Afinal, mais de um ano havia se passado e nenhuma flor desabrochara naqueles galhos verdes.
            Apesar de todo o empenho em regá-la diariamente, adubar, perseguir as formigas que vez ou outra costumavam querer roubar as folhinhas da planta, ela continuava quase idêntica de quando a comprara – apenas um pouco maior em tamanho – mas com as mesma folhas e galhos esticados. Não que esses galhos fossem pouco majestosos, eram bem esverdeados e lotados de pequenas folhinhas, porém, sem outra cor além do verde.
            Após tanto tempo sem ver brotar nela um único botão, a mulher passou a regar aquela planta com certo desprezo das demais. “É melhor que eu veja florescer algumas pétalas de seus galhos, caso contrário, já sabe! ”, dizia ela, todas as vezes que a regava, a fim de intimidar a pequena planta. 
            E a planta, a partir dessas afirmações, afundava em profunda tristeza. Ela torcia todos os dias para que seu corpo florisse, mesmo sabendo que não era a hora adequada. Entretanto, apesar de tamanho desejo, dias se passavam e nenhum botão dava sinal de vida. Cansada de tanto ouvir as reclamações de sua dona, a pequena planta já se considerava inútil, pois as flores lhe faltavam, e, portanto, sua beleza e função naquele espaço estavam comprometidas.
            Afinal, ninguém queria ver os belos galhos verdes, por mais belos que pudessem parecer. Todos queriam magníficas flores cheirosas e coloridas, para encantar os possíveis visitantes daquele jardim. Porém, isso a planta não podia oferecer. Não naquele momento.
            Ela precisava de mais tempo. Não sabia de quanto mais, talvez uma semana, um mês, um ano.... Como saberia? Era jovem e tinha dificuldade de compreender tudo que acontecia com seu corpo.
            Cansada de ouvir a mesma ameaça de sua dona, e rodeada dos próprios pensamentos negativos que reformulava sobre si, a flor foi ficando cada vez menos verde. Ela parou de crescer, seus galhos começavam a ficar secos e caídos, e suas folhas verdes desprendiam-se sozinhas e caíam no chão.
            Diante disso, a mulher percebeu que a planta estava ficando diferente e pensou ser falta de água. Assim, passou a regá-la mais vezes ao dia, porém, de nada adiantou.
            Ao fim de um mês desde que suas folhas passaram a cair, os pensamentos continuavam. “Cresçam botões...”, e perante a frustração, “Ah, eu sou inútil, não consigo dar a ela nem mesmo pequenas flores. ”.
            Nesse ínterim, não existiam mais os belos galhos verdes, de folhinhas saudáveis. Agora, galhos secos, sem folhas, quase ausentes de vida era o cenário que prevalecia. Apenas um dos galhos, esse bem escondido e esquecido, continuava verde.
            Nesse ponto, a dona do jardim, acreditando que a planta já havia morrido, preparou-se para dar fim aquela paisagem horrível qual atrapalhava sua decoração. Colocou duas luvas de plástico em suas mãos e sem nenhuma dificuldade arrancou a raiz da planta do vaso. Levou-a até o latão de lixo do quintal e a despejou ali. “Desperdicei dinheiro com essa planta. ”, pensou, após dar as costas para admirar as outras plantas de seu jardim, essas todas floridas.

            Enquanto isso, dentro da escuridão do latão de lixo, naquele último galho verde, o menor e mais frágil, havia um botão, e dele a flor morreria, antes mesmo de nascer. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário