Sempre,
às cinco horas da tarde, ia caminhar na praça próxima a minha casa. E, todos os dias, eu encontrava uma senhora,
com o cabelo completamente branco, curto e o corpo já frágil, magro, que ela
apoiava em uma bengala marrom. Geralmente, ela usava um short esverdeado e uma
blusa branca, e pequenos sapatos fechados no pé. Nunca a vi lendo ou fazendo
qualquer outra ação que não fosse apenas sentar-se. Sempre a encontrava no
mesmo horário. Nós duas, na mesma hora, víamo-nos de longe na praça. Eu
caminhava e ela permanecia sentada.
Seus passos lentos acompanhados do
auxílio a dirigiam até um banco isolado, debaixo da sombra de uma árvore. Ela
acomodava-se no banco de cimento e ali ficava. A senhora observava as pessoas
que passavam, os cães de rua, as crianças, os carros. Às vezes, ela passava a
mão em sua cabeça em um sinal de pequenas angústias. Eu perguntava-me quais
seriam seus pensamentos.
Passei a observá-la cada vez mais.
Não existia um único dia que ela não estivesse ali, sempre sozinha, assim como
eu.
Um dia, havia uma mãe com uma
criança brincando na praça. A senhora, como de costume, ajeitou-se no banco,
mas dessa vez voltou seu corpo para olhar o pequeno menino, o qual sorria e
mostrava os brinquedos a mãe, que mal se esforçava para agradá-lo, mexendo
somente no celular. Mesmo assim o garoto continuava a se divertir. E a senhora,
também parecia divertir-se, apesar de singelamente. Pela primeira vez, em quase
um mês que a via, ela deu um leve sorriso.
Imaginei se a senhora relembrava de
seus tempos de infância e por isso sorriu. Ou se somente ela havia achado
engraçado a cena. Mas provavelmente, era algo mais nostálgico. Eu mesma, vendo
tudo aquilo, pude ver as três partes da vida. As etapas pelas quais nós
atravessamos, conduzidos pelo tempo. A infância, a vida adulta, e a velhice. E,
incrivelmente, as três partes estavam reunidas naquele momento. O pequeno
menino, eu, e a senhora. Nós três, pedaços diferentes, nos unimos delicadamente
naquela praça, como iguais. E, ambos na solidão pessoal de cada momento. O
menino, sem atenção completa da mãe, eu, caminhando solitariamente, e a
senhora, sentada no banco desacompanhada. Nossas vidas se interligaram de uma
forma sutil.
Parei de caminhar. Maravilhada pela
cena, apenas a observei. Talvez aquilo era a sensação de estar interligado a
tudo e a todos. Ali, havia a exemplificação de como o que apelidamos de vida
funciona. E o quanto o ser humano é frágil e pequeno para compreendê-la.
Vivenciando aquele momento, eu tinha a consciência dele, e olhando para o menino,
senti saudade do que um dia fui: criança. Olhando para a idosa, senti
insegurança pelo que poderia ser. A
senhora, provavelmente tinha saudade da infância, da mocidade, e da vida
adulta. Mas, diferente de mim, ou da senhora, o menino não pensava nisso. Ele
apenas brincava. E provavelmente isso era o mais maravilhoso de ser criança.
Sem preocupar-se com um tempo distante ou um tempo passado. Afinal, o máximo de
passado que uma criança tem saudade é do dia anterior. Como gostaria de ser
assim, pensei.
Sempre que passava pela senhora,
tinha vontade de sentar ao lado dela naquele banco e conversar. Ela deveria ter
muito a dizer. E mesmo que não tivesse e somente falasse coisas sem sentido,
para mim já estaria de bom tamanho. Eu não tinha muitas pessoas com quem
conversar. Pensava que, talvez, unindo duas pessoas afundadas na solidão,
pudéssemos fazer sair algo bonito. Nem que fosse uma conversa durante dez
minutos, já seria suficiente, se fosse verdadeira. Porque o que mais faltava
para mim eram conversas verdadeiras. Aquelas que você pode expor sua alma,
pensamentos e conclusões e terá alguém para ouvi-las e entendê-las
perfeitamente, ou pelo menos, tentar compreendê-las. Sentia que nesse mundo
atual, isso faltava. Ninguém mais pergunta se está tudo bem com você querendo
saber a verdade. As conversas são tão vazias. Tão superficiais. E, se por
acaso, há a tentativa de aprofundá-las, não há tempo. Nunca há tempo! Falta
tempo para pensar, conversar verdadeiramente, chorar, sorrir. Simplesmente
falta tempo. De certa forma, pensei que aquela senhora poderia ter tempo.
Poderia me escutar. Porém, tinha receio de me aproximar. Não sabia como
realizar tal idealização. Talvez ela assustasse, ou me ignorasse, ou não
quisesse conversar, quisesse apenas olhar em silêncio, como fazia todo dia.
Dias passaram-se sem que eu me
sentasse no banco. Ela via-me, eu a via, e nada dizíamos, apenas trocávamos
olhares. Eu continuava a seguir meu caminho pela praça e a senhora a ficar
sentada. Nós tínhamos uma solidão compartilhada. Uma sabia da solidão da outra
e nisso nos refugiávamos. Não estávamos sozinhas. Mas também não estávamos
juntas. Talvez apenas interligadas, como tudo no universo está. Nós éramos
também parte daquele universo.
Depois de uma semana, decidi,
finalmente, tomar coragem de sentar-me no banco para conversarmos diretamente.
Contudo, no dia de minha
determinação eu não mais vi a senhora no banco. No outro, também não. Na outra
semana, nada. Ela desapareceu da praça. Eu olhava para o banco sem a ver e
ficava triste. O banco ali, sozinho, vazio. Perguntava-me o que teria
acontecido com ela. Estaria doente? Ou algo pior até... morta? Como poderia
saber? Eu queria descobrir, mas era impossível. Não sabia nem seu nome, apenas
recordava de seu semblante que se misturava com a imagem dela da praça. Afinal,
seu corpo já pertencia àquele lugar.
Assim, semanas passaram e eu continuei sem
vê-la. Aos poucos, minha vontade de ir à praça foi diminuindo. Apesar disso, eu
ia, com a esperança de encontrá-la novamente.
Em uma tarde, cansada da caminhada,
resolvi sentar-me no banco de cimento. Cuidadosamente, fui até ele, como se
fosse algo até sagrado. Sentei-me. Olhei ao redor e, para minha surpresa, vi
várias flores de diversos tipos no entorno daquele banco de cimento cinza.
Rosas, margaridas, cravos. Eram tantas, umas diferentes das outras, tanto em
cor quanto em tamanho, forma. Elas encantavam aquele local tão singelo.
Tornaram-no delicado, belo.
Supus que a cada dia no banco, a
senhora jogava uma pequena semente. E, aos poucos, as plantas foram nascendo,
devagar, sem que ninguém percebesse. Assim, após mais de meses, ali estavam
elas, grandes e belas. Pude entender que mesmo aquela solidão, trouxe flores.
Infelizmente, nunca mais vi a mesma
senhora que, por tanto tempo, e ainda mais depois de ver as flores, admirei.
Contudo, para não interromper com seus planos, cada dia de caminhada eu levava
uma semente de uma fruta que comia durante a manhã. E, assim, plantava-as
delicadamente nos vãos da praça. Além de plantar, quando muito grandes, eu
mesma ia lá e as podava, para deixar o ambiente mais agradável possível. E, aos
poucos, a praça foi tornando-se mais famosa e conhecida na cidade, por tamanha
beleza das árvores e flores que ali brotavam. Muitas pessoas passaram a visitar
aquele local que, antes praticamente só meu e da senhora, abria-se agora para o
mundo.





